Quando era criança, olhava-me ao espelho e via um jardim.
Não um jardim exuberante, certinho, estonteante de tão belo,
mas um pedaço de terra virgem à espera da semente, da rega, do cuidado diário,
da paciência.
Olhava-me ao espelho e via um jardim. Olhava-o com a bondade de quem erra e estava disposto a crescer; com a ternura de quem afagava a pele da terra e nela se fundia como gota de orvalho pela manhã.
Jardins não nascem prontos.
Precisam tempo, paciência, cuidado, insistência, persistência.
Precisam de Amor, mas também de espaço.
O meu jardim tinha sede de afecto – precisava do sol dos olhos de quem me amava, do abraço firme, de se sentir querido.
Por vezes também precisava de solidão, porque é nela que que nos encontramos, que descobrimos a nossa essência, fazendo as perguntas que têm que ser feitas. É nesse aparente enorme vazio da solidão que o projecto de nós se esboça e começa a tomar forma.
Aprendi cedo que muito do que sou uma mescla do que fui construindo dentro de mim e do que a vida me deu, no contacto/ aprendizagem com os outros.
Ninguém é feliz sozinho e por isso, devagar, lentamente fui semeando no jardim que era e sou , outras flores, outras arvores, outros arbustos. Fui arrancando as ervas daninhas, ordenando os canteiros, percebendo como tinha que os organizar para tirar o melhor de cada um e não abafar o esplendor de nenhum, ousando experimentar outros aromas.
Cresci. Continuo a crescer, porque a isso me obrigo e porque o jardim continua a precisar ser cuidado, regado, apreciado, diariamente.
Às vezes visto-o de festa; outras de saudade; às vezes nostalgia, outras, amizade.
Agora tem pele de jardim de inverno. As flores dormem o sono de beleza que a primavera irá despertar. Dormem e merecem esse repouso reparador.
Estou nua, exposta, mas isso não me perturba.
O ciclo é mesmo assim…
Por isso afago com gratidão o acordar e o sentir do pulsar da vida em cada amanhecer.
©Graça Costa
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