Espartanas, as gotas de orvalho acariciavam-lhe o rosto,
antecipando um solarengo dia de outono.
Mas a sua alma estava negra
como negro parecia o futuro,
e a mão que lhe oprimia as palavras.
Palavras dolorosas e quentes,
enfurecidas nos horizontes da memoria
e na fonte dos sonhos.
Sentiu-se insegura,
quase patética,
numa fragilidade infantil
em que não se reconhecia.
Como pérolas
recolheu as gotas de orvalho,
uma a uma,
quase a medo
e ante aquela pureza vestal
ousou criar a alquimia da vida.
Juntou o sal dos olhos
ao sussurro da alma aflita,
e mesclou com um grito de esperança…
ténue esperança,
mas ainda assim…
esperança.
Juntou ao olhar e aos sentidos
a paleta de cores do universo,
e junto ao lago, agora feito mar,
largou, o negro
como quem larga uma capa usada e gasta pelo tempo e pela
dor.
Depois,
envergando apenas a subtil beleza da nudez acabada de parir
encontrou a razão…
a razão de ser,
a razão de estar ali,
a razão de ser quem era.
E porque a razão tinha razão…
deu a si mesma a oportunidade
de renascer.
Mergulhou naquele mar
salgado como a vida,
doce como um beijo,
revolto como a paixão,
misterioso como o milagre
do ritmo sereno das marés
e navegou,
usando a rota do sonho
plantada no interior de si.
©Graça Costa
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